Os desafios da educação climática no ambiente escolar
- Murilo Nascimento
- 3 de abr.
- 6 min de leitura
Atualizado: 5 de abr.
A importância da educação climática nas escolas e seu papel na formação de cidadãos conscientes, aptos a mitigar os impactos das mudanças climáticas
Por: Wilyane Braga
© Wilyane Braga

As mudanças climáticas trazem uma série de consequências ambientais graves que se manifestam, como secas, ondas de calor, incêndios, chuvas intensas — como as que ocorreram no Rio Grande do Sul em 2024 e a perda da biodiversidade. Esses são apenas alguns dos efeitos já observados. Diante da urgência de compreender as causas e os impactos desse fenômeno, é fundamental buscar formas de mitigar seus efeitos. Sendo assim, a educação climática pode ser utilizada como uma parte da solução para os impactos ambientais.
Segundo dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o verão de 2024-2025 foi o sexto mais quente no Brasil desde 1961, com temperaturas atingindo um nível recorde de 0,34°C acima da média histórica. Diante desse cenário, a implementação de processos de mitigação se torna necessária para reduzir os impactos e proteger as gerações futuras.
De acordo com o relatório sobre o Estado do Clima Global 2024 da Organização Meteorológica Mundial (OMM), 2024 foi o primeiro ano a registrar uma temperatura 1,5°C acima dos níveis pré-industriais, tornando-se o ano mais quente desde o início dos registros climáticos, há 175 anos. O aumento contínuo das emissões de gases de efeito estufa, como dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxidos de nitrogênio (NOx), é o principal responsável pelo aquecimento global e pelos recordes de temperatura observados.
Embora os impactos das mudanças climáticas se manifestem de maneira cada vez mais intensa, em eventos climáticos extremos e na degradação ambiental, a educação climática surge como uma ferramenta poderosa no enfrentamento desses desastres. Ela capacita os cidadãos a entenderem as causas dessas mudanças e a se prepararem para os desafios trazidos pelo aquecimento global.
O professor Alexandre Pinto, do Departamento de Ecologia da Universidade Federal de Sergipe (UFS), destaca que entender como as ações humanas influenciam a variação do clima e como podemos nos preparar para os desastres ambientais causados pelo aquecimento global é o objetivo da educação climática.
Ações que fazem a diferença
Com a crescente ameaça das variações climáticas, a educação climática tornou-se uma ferramenta essencial para a transformação social e ambiental. No entanto, muitos ainda não compreendem a profundidade das consequências de suas ações cotidianas. Como sociedade, é fundamental que busquemos maneiras de cultivar uma consciência crítica e responsável sobre a crise climática e suas implicações para o futuro de todos.
Em meio ao crescente temor sobre os impactos dessa instabilidade climática, a Lei 14.926, sancionada pela Presidência da República em 17 de julho de 2024, estabelece a obrigatoriedade de temas relacionados às mudanças climáticas e à proteção da biodiversidade nas salas de aula a partir de 2025, em todas as escolas brasileiras. Essa lei modifica a Política Nacional de Educação Ambiental (Pnea — Lei 9.795, de 1999), incorporando o estudo desses temas como um dos objetivos da educação ambiental nacional.
“As ações humanas influenciam na variação do clima e como que a gente pode se preparar para os desastres ambientais cada vez são mais frequentes, por causa do aquecimento global é uma educação climática. Como o cidadão pode, no dia a dia, contribuir para reverter esse processo, também faz parte.” - Prof. Alexandre Pinto
A educação climática não se limita ao ensino teórico, mas busca preparar os cidadãos para adotar medidas que contribuam efetivamente para a mitigação dos impactos do aquecimento global. Esse conceito destaca a importância de transformar o conhecimento adquirido sobre as mudanças climáticas em ações práticas e cotidianas.
Embora a Lei 14.926 represente um marco significativo, a verdadeira transformação ocorre no cotidiano. Como sociedade, temos o compromisso de disseminar o conhecimento sobre as mudanças climáticas, desde a sala de aula até os nossos locais de trabalho. Apoiar a implementação da lei, exigir políticas públicas eficazes, agir como agentes de mudança e adotar práticas sustentáveis em nossas rotinas diárias são passos essenciais para garantir que a educação climática se traduza em ações concretas, capazes de mitigar os danos ambientais que enfrentamos.
Para Cássia Moura, gastrônoma, funcionária pública e moradora de São Cristóvão, a conscientização ambiental deve ser incorporada às práticas cotidianas. Ela defende que a mudança começa com ações simples dentro de casa. "Se eu não começo em casa, com os meus, a preservar o meio ambiente, qual responsabilidade estou tendo com a natureza?", questiona Cássia. Ela acredita que a educação climática não deve se limitar às salas de aula, mas se estender a todas as esferas da vida, como um compromisso diário de cada indivíduo.
Ainda na opinião da gastrônoma, a verdadeira transformação só ocorrerá quando começarmos a incorporar práticas diárias que respeitem e cuidem dos recursos naturais, como o manejo consciente da água e a proteção do entorno. Para ela, a mudança está nas políticas e no compromisso individual e coletivo de cada um com o futuro do planeta. "Se eu não preservo, se eu não tenho carinho, e não olho pelo meio ambiente, não estou cuidando de mim como ser humano nem dos meus", complementa.
O papel da escola
A educação climática nas escolas desempenha um papel essencial na formação de cidadãos conscientes e responsáveis. Ao integrar o aprendizado sobre mudanças climáticas com ações práticas, as escolas podem impactar positivamente a vida dos alunos e a sociedade. Por meio de atividades como cultivo de plantas e projetos de preservação, as escolas podem promover uma mentalidade mais sustentável nas novas gerações.
Exemplo disso é a Escola Jardim Arcanjo Raphael, em Aracaju, que adota a Pedagogia Waldorf em seu currículo escolar. Esse método de ensino busca estabelecer uma conexão profunda entre as crianças e a natureza, respeitando os ritmos naturais e os ciclos do mundo ao redor. Na Pedagogia Waldorf, a educação climática é tratada de forma prática e vivencial, permitindo que as crianças se envolvam diretamente com o meio ambiente. Através de atividades como cultivo de plantas, cuidado com a terra e observação dos processos naturais, elas aprendem sobre as mudanças climáticas e o impacto das ações humanas no mundo natural.
Para a pedagoga e fundadora da escola, Maria Terezinha Paschoal, permitir que as crianças interajam com o meio ambiente fortalece a consciência ecológica desde cedo, criando um vínculo afetivo com a natureza e incentivando atitudes sustentáveis que podem durar por toda a vida. “Quando a criança tem a vivência de plantar, acompanhar uma planta, mexer com a terra, saber que tem um matinho que precisa tirar senão a planta não vai crescer, é muito importante, porque elas levam pra vida”, comentou Terezinha.
Uma pesquisa publicada pela British Ecological Society Journal People and Nature, em 2020, confirma que as crianças tendem a ser mais felizes e têm maior probabilidade de proteger o meio ambiente quando mantêm um vínculo com a natureza. Esse estudo reforça a visão de Maria Terezinha sobre a importância das vivências práticas, que ajudam as crianças a desenvolver uma conscientização ecológica. Atividades como o cultivo de plantas e o cuidado com o solo, realizadas na Escola Jardim Arcanjo Raphael, ilustram essa abordagem, incentivando as crianças a agir de forma responsável com o meio ambiente.
De acordo com o pedagogo Leonardo Paschoal, também fundador da Escola Jardim Arcanjo Raphael, uma das atividades práticas realizadas com as crianças envolve a criação de bolas de barro com sementes de plantas nativas. "As crianças ajudam a colocar as sementes dentro da argila, e depois, quando as bolas secam, elas as lançam em locais como beiras de estrada para que as sementes germinem ao longo”, explica Leonardo. Essa prática é realizada na horta da escola, com o objetivo de conectar as crianças à natureza, estimulando nelas o cuidado com o meio ambiente desde a infância.
© Wilyane Braga
Terezinha e Leonardo Paschoal, fundadores da Escola Jardim Arcanjo Raphael
Enquanto a Escola Jardim Arcanjo Raphael, em Aracaju, adota uma abordagem prática e vivencial para ensinar sobre sustentabilidade, o Colégio Estadual Leonor Teles de Menezes enfrenta desafios na implementação da educação climática. A professora de biologia, Bárbara Cunha, que leciona no Ensino de Jovens e Adultos (EJA) à noite, destaca que, devido à carga horária reduzida e à falta de infraestrutura, as aulas são concentradas principalmente na teoria. Com apenas 30 minutos por noite, ela busca sensibilizar os alunos para os impactos das mudanças climáticas, como o aumento das temperaturas e a escassez de água, problemas já vividos na região.
Apesar das limitações, Bárbara acredita que o ensino teórico tem gerado conscientização. “A prática para mim, maior do que o dia-a-dia no trabalho deles, não tem. E como eles trabalham com isso, hoje eu vejo que eles são muito mais conscientes”, afirma. A professora busca abordar as causas e consequências das mudanças climáticas, com foco em problemas locais, como as queimadas e a preservação do meio ambiente, essenciais para o sustento dos alunos, que em sua maioria vivem da pesca e da coleta de lixo.
Segundo a coordenação do Colégio Estadual Leonor Teles de Menezes, o horto escolar está atualmente desativado devido à falta de verbas, o que limita as atividades práticas relacionadas à sustentabilidade. Além disso, a escola passará por reformas, o que pode impactar ainda mais a implementação de ações de educação climática e ambientais no espaço escolar.
© Wilyane Braga
Horto desativado do Colégio Estadual Leonor Teles de Menezes
Para finalizar, o professor Alexandre Pinto ressalta a importância de conscientizar a sociedade sobre como pequenas atitudes diárias podem contribuir para o enfrentamento da crise climática. "Pensando numa adequação climática, existem ações do cotidiano que o cidadão comum pode fazer e a escola tem um papel fundamental de esclarecer, de como que a minha atitude no dia a dia pode contribuir para o enfrentamento da crise climática e não contribuir para a crise climática".
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